Capacitismo e o mito da superação

Pessoas com deficiências não são heróis.

Você já reparou em como as pessoas com deficiência, costumam ser retratadas pela mídia? Grande parte das reportagens a respeito destas pessoas vem permeada pelos chamados discursos de superação. “Fulano superou sua deficiência X e hoje estuda/trabalha”; “Apesar de ter a deficiência Y, Sicrano é feliz/venceu na vida”.

E qual seria o problema de se utilizar tais expressões? Todas elas são implícitas ao capacitismo. Este nome, não muito conhecido, designa a crença social de que a pessoa com deficiência é incompleta, diferente e menos apto para executar qualquer função ou gerir a própria vida.

Imagem com homem de frente a uma parede. A projeção da sua sombra mostra um herói com uma capa. Fonte: gettyimages
#PraCegoVer: Imagem com homem de frente a uma parede. A projeção da sua sombra mostra um herói com uma capa. Fonte: gettyimages

Agora, você pode estar pensando o porquê estou falando tudo isso? Na verdade, todos os discursos que supracitei já ouvi grande parte deles, pois desde os 5 anos sou deficiente visual e escutar coisas do gênero se tornou um hábito na minha vida.

É certo que podemos enfrentar mais dificuldades do que as pessoas sem deficiências devido à falta generalizada de acessibilidade em nossa sociedade. Nosso caminho pode ser mais árduo, ao termos que arcar com os impedimentos impostos pelas interações entre nossas deficiências e as barreiras físicas, comunicacionais, atitudinais e outras presentes no mundo em que vivemos.

Mas isto, por si só, não deveria ser motivo para sermos taxados de “heróis” ou “exemplos de superação”. Quantos outros indivíduos também não enfrentam barreiras diversas, como as econômicas, sociais, psicológicas, ou seja do tipo que for? Deste jeito, o mundo não estaria repleto de pessoas, e sim de seres idealizados e perfeitos.

E a heroicidade cobra o seu preço. Este rótulo cria um muro que separa socialmente o indivíduo referido das demais pessoas. É legal louvar um “herói”, mas e quanto a interagir com ele, torná-lo parte do seu círculo de amizades? O mais comum é colocar tal “herói” em um pedestal, deixá-lo inalcançável, mas, ao mesmo tempo, cobrar dele uma perfeição em suas ações. Então, como podemos evitar todos estes equívocos que acompanham os discursos de superação? Simples: devemos enxergar a pessoa, o ser humano, em primeiro lugar. Não criar rótulos baseados em uma de suas características. Podemos (e devemos!) falar sobre deficiências, mas com o objetivo de naturalizá-las, mostrar que elas não são algo extraordinário. No lugar da exaltação e da busca por “heróis” cotidianos, que tal nos preocuparmos mais com a viabilização da acessibilidade e da igualdade de oportunidades a todos.

Texto escrito por: Bruno da Silva Paulo – Assistente Administrativo no Senac em Minas e graduado em Ciências Contábeis e em Gestão Financeira, pós-graduado em Finanças e Mercados de Capitais, especialista em Controladoria, pós-graduado em Gestão Estratégica e Sistemas de Informação, e mestrando em Business Administration with Emphasis on Strategies and Operations of Business Networks.

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